Publicado no "Jornal da Região", edição de 27 de Junho de 2012.
DEUS LOUVA AS LIBÉLULAS
Roberto Vassallo
A natureza é sábia, pois
providenciou para que cada exterminador tenha
o seu predador, a fim de
que o equilíbrio seja constantemente mantido.
Quando, porém, o
exterminador se prolifera descontroladamente, anomalias
tornam-se visíveis.
Desequilíbrios de toda
ordem estão cada vez mais frequentes na
natureza,
provocados, ou por fatores
espontâneos, ou pela interferência humana.
Entretanto, um ramo da
ciência já admite abertamente que certos estados mentais coletivos podem
desencadear convulsões meioambientais.
Por outro lado, as
epidemias de dengue vêm ocorrendo por três motivos:
primeiro, em razão do
aquecimento global; segundo, pela prevenção ina-
dequada; e por último,
pelo descaso em identificar o(s) predador(es) na-
turais do aedes aegypti e
reproduzi-los em ambientes devidamente monitora-
dos.
Caso não se lance mão do
controle biológico imediato do aedes aegypiti, este
se tornará cada vez mais
resistente aos produtos utilizados normalmente
no
seu combate.
Com efeito, todos os
pássaros urbanos têm nos insetos sua principal fonte de
alimento, embora uma parte
prefira frutas e vermes.
A andorinha, por exemplo,
é uma das maiores devoradoras de mosquitos; jun-
to com o bem-te-vi e os de sua
estirpe impedem sua multiplicação. Sem citar
o pardal, o joão-de-barro
etc. Neste particular, o aedes aegypti não está fora do
seu cardápio.
A prova de que os insetos
constituem o prato predileto dos pássaros metropoli-
tanos está em sua presença
maior nas margens dos rios, dos
córregos, lagos, bre-
jos e nos terrenos baldios
de mato crescido, onde sua infestação é mais intensa.
Todavia, o maior predador
do aedes aegypti trabalha ativa e silenciosamente jun
to ao exército de
devoradores de insetos. Sua ação contribui substancialmente pa
ra reforçar o batalhão de
predadores naturais do causador da dengue: a libélu-
la. De globulosos olhos
grandes e com seus dois pares de longas e transparentes
asas, voam velozmente
rente à água.
A grande vantagem da
libélula é a rapidez em sua mobilidade, além dos seus voos rasantes, como foi
dito, principalmente quando se trata de perseguir o mos-
quito da dengue, cujo teto
não ultrapassa os seis metros; portanto fora
do alcance das andorinhas
que costumam planar nas alturas.
A fim de entendermos
melhor a grande utilidade da jacina, como é também conhecida, no controle
natural do aedes aegypti, vale ressaltar que, quando fecundada, a fêmea deposita seus ovos em uma planta na
água; na falta desta, simplesmente deixa-os cair no espelho dágua parada ou
corrente, ou seja, exatamente no reduto do aedes aegypti.
Finalmente, a partir da
eclosão dos ovos, o ciclo de vida da larva começa como uma ninfa(uma libélula
adolescente e feia). Elas não têm asas e vivem no ambiente líquido por um
período que pode durar quatro anos, ou mais , durante os quais passa por vários
estágios de desenvolvimento.
Agora, o mais importante.
Até a conclusão da metamorfose, as ninfas devoram tudo que estiver ao seu
alcance : larvas de peixe, girinos, larvas de mosquitos, e por aí vai.
Pelo exposto, a criação de
libélulas junto com o louva-a-deus, - outro caçador implacável de moscas e
mosquitos, usando a emboscada como estratégia, facilitada pela sua enorme
capacidade de camuflagem -, por meios artificiais, seria de grande valia na
guerra sem trégua contra esse perigo
tropical, que volta e meia inferniza a vida da população,
sobrecarregando os hospitais.
Mesmo com as estatísticas
animadoras, o Rio está saindo de uma nova epidemia de dengue, tipo quatro.
Para devorar o aedes
aegypti, no entanto, é óbvio que tanto a libélula como o louva-a-deus
não fazem distinção tipológica, simplesmente os capturam para saciar a fome.
Esse bichinhos do bem, na
interpretação humana,- uma vez que bem e mal não existem na natureza, somente
instinto -, seriam soltos em larga escala, mormente
nos locais onde a
ocorrência da dengue é mais acentuada.
Abro um parêntese para
citar o guaxinim, outro predador insaciável de ratos, mormente quando está com
cria. Sua introdução nas margens dos poluídos rios metropolitanos, com certeza
ajudaria, e muito, no controle biológico dos roedores. Parêntese fechado.
Até onde se sabe, as libélulas
não são alvos fáceis para certos pássaros, mesmo
porque são bem mais ágeis
e velozes do que eles, embora também devam ter seus
inimigos naturais. Com a
palavra os especialistas.
O louva-a-deus, de
mobilidade mais lenta, pelo fato de medrar nas árvores, não
fosse o seu mimetismo
mágico, seria uma presa praticamente
indefesa dos pássaros.
Pelo sim, pelo não,
enquanto os laboratórios ingleses não liberam para nós as fêmeas esterilizadas
artificialmente do aedes aegypti; e os pesquisadores brasileiros não espalham
na natureza as larvas geneticamente modificadas, fazendo o mosquito da dengue
nascer sem asas, as autoridades da saúde poderiam começar a pensar na criação
imediata de libélulas e louva-a-deus em cativeiro. Além de mais barato, seria
ecologicamente correto.
Enquanto tal não acontece,
a população sofre e se defende como pode.
Roberto Vassallo é jornalista e pesquisador.
Ex-integrante do Comitê de Defesa do Pantanal
Membro da Associação Protetora dos Animais
Membro da Associação Protetora dos Animais